Eduardo
era um homem alto, branco, bonito, polido. Nasceu em uma família de classe
média, portanto, não conhecia a dureza da vida; Desde pequeno os pais haviam
feito de tudo por ele, no auge da adolescência ainda tentou se envolver com os
perigos atraentes e astuciosos da vida, mas a mãe e o pai logo trataram de se
mudar para outro lugar e de envolver o filho em um grupo social considerado “de
futuro”.
Assim
cresceu Eduardo, depois da escola veio faculdade. Era um rapaz de encher
qualquer mãe de orgulho: educado, fino, dedicado nos estudos, cheio de graça e
vigor; ele era o distintivo dourado ridiculamente exposto no peito dos pais.
Ainda
na faculdade, Eduardo conheceu Anabela, moça decente, de boa família, estudiosa,
amorosa com os sogros, um doce de menina. A única diferença entre ambos era que
ela não havia crescido debaixo das asas dos pais, pelo contrario, Anabela
conhecia o mundo com todo seu som, verso e cor. Contudo, nem mesmo isso era
capaz de atrapalhar aquele amor, os dois se amavam intensamente, contavam com o
apoio das duas famílias, não poderia haver sorte maior no mundo do que a dos
pombinhos.
Terminando-se
a faculdade, o casal prodígio conseguiu emprego, casaram-se, construíram uma
casa, e o mundo era toda em cor de rosa.
Nos
primeiros meses de casados tudo parecia perfeito, quando um ou outro erravam,
baixavam a voz, ouvia-se um pedido de desculpas e a promessa de mudança, depois
vinham os beijos e, finalmente, o “eu te amo”.
O tempo, porém, descobri toda a vaidade da
alma humana, deixa qualquer individuo nu, só permanecendo o verdadeiro. Não foi
diferente com Eduardo e Anabela, tudo aquilo que antes não significava nada,
agora era como um tsunami ou um furacão, só devastava. Eduardo não queria
largar a mania de viver apegado e protegido pelos pais, Anabela conhecia a
beleza e a dureza do mundo muito de perto para se conformar com tal atitude.
Viviam
brigando e discutindo, os vizinhos, agora, ouviam gritos constantemente, não
haviam mais pedidos de desculpas, o “eu te amo” havia dado lugar para o “vá
para o inferno”. Os pais de Eduardo colocavam a culpa toda na mossa, repetiam
pelos quatros cantos do mundo:
-Essa moça não presta, eu nunca
fui com a cara dela, não sei como nosso filho pode se envolver com essa mulher.
Já
os pais de Anabela pediam cautelosamente a filha para que tivessem calma, as
coisas iriam se ajeitar com o passar dos dias.
O
tempo passou, e o casal que, anteriormente, era o mais feliz do mundo, brigava
bravamente, depois faziam as pazes, para voltar a discutir novamente. Mas, era
assim que sobreviviam, em um ritmo de respiração incompreensível, mas era assim
que sobreviviam, era assim que eram feliz.
Até
que um dia, Eduardo e Anabela realmente brigaram, a vizinhança só ouvia os
gritos, misturado as alterações de voz ouvia se também os estilhaços das coisas
se quebrando. Choro, grito e estilhaço.
O
motivo da briga?
Vários
motivos acumulados.
Era
a dependência dele da opinião dos pais, era a liberdade exagerada dela frente à
vida, o trabalho dela era até tarde, ele parecia não ligar mais pra ela, ela
era autoritária, ele ciumento, o guarda-roupa estava bagunçado, a pia cheia de
louça.
Depois
da longa briga, Eduardo sem saber o que fazer, correu para a casa dos pais,
chegando lá contou tudo o que havia ocorrido, nos mínimos detalhes, contou que
os pratos estraçalhavam no chão enquanto ela gritava que estava arrependida.
Os
pais muito protetores aconselharam-no a deixar Anabela, diziam que ela não o
merecia e que, ele ainda era jovem e iria arranjar outra pessoa, afinal ele não
merecia viver o resto da vida sendo infeliz.
Eduardo
não pensou duas vezes, resolveu voltar para casa e pedir o divorcio. No caminho
de casa só pensava em como seria feliz quando estivesse só, não haveria mais
brigas e nem gritos. Se ela estava arrependida que fosse embora e vivesse
feliz, ele estava lhe dando a carta de alforria.
Ao
chegar em casa, passou pelo hall de entrada, atravessou a grande sala de estar
de paredes brancas, andou por toda a casa a procura de Anabela, queria
encontrá-la para dar lhe a sentença de que era livre para ser feliz. Porém,
Eduardo não encontrou Anabela, nem no quarto, nem no banheiro, nem na cozinha,
nem no jardim, não havia o menor sinal dela pela casa. Finalmente, quando
estava quase desistindo, ele encontrou um bilhete que dizia:
“Eduardo, meu grande amor, ao
conhecê-lo achei que seriamos felizes, e nós fomos felizes, mas por pouco
tempo. Hoje, porém, eu não o reconheço mais, não faço a menor de quem é esse
homem que se deita ao meu lado todas as noites, e mesmo quando temos os nossos
momentos de carinhos e deleites eu não o reconheço. Desculpe-me, mas não posso
viver assim, com um desconhecido, estou indo embora, não tente me procurar, por
todo o amor que diz ter por mim, apenas, me deixe ir.”
Ao
terminar de ler a sua carta de alforria, Eduardo estava em choque, suava frio,
não conseguia se quer entender o que havia acontecido. Como Anabela teria ido
embora dessa forma? Ele a amava, como iria viver agora? Como iria sobreviver
sem ela? E ele nem podia, ao menos, procurá-la!
Desnorteado
com o rumo da situação, Eduardo entrou no seu carro e dirigiu até o viaduto mais
próximo. Chegando ao local, desceu do carro, os automóveis atrás do seu
buzinavam loucamente, os motoristas falavam todos os palavrões possíveis.
Eduardo parecia estar a par da situação, só olhava para baixo, lá embaixo os
carros passavam a toda velocidade em uma corrida contra o tempo.
“Como farei para sobreviver?
Como irei trabalhar todos os dias? Como será quando chegar em casa a noitinha?
O que direi as pessoas? Como será minha vida sem o meu Amor?”
Faltavam
respostas a essas perguntas, faltava sentido para a vida. Eduardo olhou a luzes
acesas da cidade, a sua escuridão noturna, os carros correndo contra o relógio,
as buzinas, os motoristas, as luzes da cidade, e pela primeira vez se sentiu
livre, mas essa era a liberdade mais solitária que poderia existir no mundo. Ele
nem poderia contar a Anabela que a cidade, à noite, iluminada pelas luzes
reluzentes, é épica. Ele não poderia. Então olhou uma última vez para a cidade
que o consumia, o libertava e o afligia, respirou fundo e pulou do viaduto.
Lá
embaixo, os carros parraram de correr contra o tempo, alguém tenta chamar
ajuda. Lá em cima, um congestionamento enorme, buzinas soando, e pessoas
atônitas pelo que viram. No chão da avenida, o que sobrou de um desconhecido da
multidão e que por algum motivo não achou sentido na vida.